A apologética da política económica neoliberal rege-se por uma teia de conotações e associações de palavras como flexibilidade, maleabilidade, desregulamentação, reajustamentos, reformas estruturais, que tendem a fazer crer que a mensagem neoliberal é, usando as palavras de Pierre Bourdieu, “uma mensagem universalista de libertação”.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

CRISE E DÍVIDA NA EUROPA



Mesmo que o aumento da dívida pública tivesse resultado, em parte, de um aumento das despesas públicas, o corte destas despesas não contribuiria necessariamente para a solução, porque a dinâmica da dívida pública não tem muito a ver com a de uma casa: a macroeconomia não é redutível à economia doméstica. A dinâmica da dívida depende de vários factores: do nível dos défices primários, mas também da diferença entre a taxa de juro e a taxa de crescimento nominal na economia.
Ora, se o crescimento da economia for mais débil que a taxa de juro, a dívida cresce mecanicamente devido ao “efeito bola de neve”: o montante dos juros dispara, o mesmo sucedendo com o défice total (que inclui os juros da dívida).
Foi assim que, no início da década de noventa, a política do franco forte, que se manteve apesar da recessão de 1993/94, se traduziu numa taxa de juro durante muito tempo mais elevada do que a taxa de crescimento, o que explica a subida abrupta da dívida pública em França neste período. Trata-se do mesmo mecanismo que permite compreender o aumento da dívida durante a primeira metade da década de oitenta, sob o impacto da revolução neoliberal e da política das taxas de juros elevadas, conduzidas por Ronald Reagan e Margaret Thatcher.
Mas a própria taxa de crescimento da economia não é independente da despesa pública: no curto prazo, a existência de despesas públicas estáveis limita a magnitude das recessões (“estabilizadores automáticos”); no longo prazo, os investimentos e as despesas públicas (educação, saúde, investigação, infra-estruturas…) estimulam o crescimento. É por isso falso afirmar que todo o défice público aumenta necessariamente a dívida pública, ou que qualquer redução do défice permite reduzir a dívida. Se a redução dos défices comprometer a actividade económica, a dívida aumentará ainda mais.
Uma redução simultânea e maciça das despesas públicas, no conjunto dos países da União Europeia, apenas pode ter como consequência uma recessão agravada e, portanto, uma nova subida da dívida pública.
Para evitar que o reequilíbrio das finanças públicas provoque um desastre social e político, coloca-se em debate duas medidas:

Primeira medida: Manter os níveis de protecção social e, inclusivamente, reforça-los (subsídio de desemprego, habitação…)
Segunda medida: Aumentar o esforço orçamental em matéria de educação, de investigação e de investimento na reconversão ecológica e ambiental, tendo em vista estabelecer as condições de um crescimento sustentável, capaz de permitir uma forte descida deo desemprego.
(Manifesto dos Economistas Aterrados)

quinta-feira, 4 de julho de 2013

AS AJUDAS DO FMI




Quando o FMI decide ajudar um país, despacha para lá uma "missão" de economistas. Esses economistas em geral sabem pouco sobre o país em questão; muito provavelmente, sua experiência directa será restrita aos hotéis de cinco estrelas e não se estenderá às cidades. Eles trabalham duro, desfiando números e números até tarde da noite. Mas a tarefa deles é impossível. Em poucos dias ou, no máximo, semanas, precisam desenvolver um programa coerente e sensível às necessidades daquele país. Desnecessário dizer que um pouquinho de econometria raramente fornece uma perspectiva clara do desenvolvimento estratégico de uma nação inteira. Pior ainda, o exercício econométrico nem sempre é muito bem feito. Os modelos matemáticos empregados pelo FMI são frequentemente falhos ou desactualizados. Os críticos acusam a instituição de adoptar uma abordagem do tipo "fábrica de salsichas" para lidar com a economia. Sabe-se que as missões elaboram rascunhos de seus relatórios antes das visitas. Já ouvi falar de um incidente infeliz em que membros da missão copiaram grandes trechos do texto do relatório de um país e transferiram-nos integralmente para outro. Teriam conseguido ocultar a proeza, não fosse o facto de que o sistema de busca-e-troca do processador de texto não funcionou direito, deixando o nome do país original em alguns trechos do segundo relatório. Ops.(Joseph Stiglitz ex-economista chefe do Banco Mundial

PORTUGAL, UM POVO ESPOLIADO E SAQUEADO

Não há dinheiro? Mas o rombo fraudulento do BPN está a custar 9 mil milhões de euros ao erário público; o défice da Madeira mais 5,8 mil milhões; o escândalo dos swaps monta a 3 mil milhões; e as PPPs rodoviárias a bagatela de 9 mil milhões de euros. Só estas quatro coisas significam um prejuízo de 26,8 mil milhões de euros para o Estado português – sem falar nas muitas outras que pejam a vida pública do país. Mas não passa pela cabeça deste serviçal da troika, o governo P.Coelho/P.Portas cortar em nada disso. O que eles querem é cortar mais 4,0 a 4,8 mil milhões de euros, até 15 de Julho próximo, nas pensões de reforma e nas remunerações de funcionários públicos.
Por este governo na rua é um imperativo de sobrevivência nacional. (RESISTIR.INFO)

segunda-feira, 24 de junho de 2013

AS CRISES CADA VEZ MAIS FREQUENTES




Nas últimas décadas, as crises financeiras e económicas têm sido cada vez mais frequentes e profundas. Com efeito, a crise do Leste asiático foi apenas a mais recente de um grande número de crises. No último quartel registaram-se crises financeiras ou económicas em aproximadamente cem países. Já se tornou quase mais vulgar ter uma crise do que não ter. (Joseph Stiglitz ex-economista chefe do Banco Mundial).

sábado, 22 de junho de 2013

SILÊNCIOS QUE GRITAM (XI) –MIGRANTES SOMOS TODOS


SILÊNCIOS QUE GRITAM
O trabalho manual por oposição à chamada actividade simbólica – o trabalho, e não o sexo, está a tornar-se cada vez mais o lugar de indecência obscena que deve ser ocultada dos olhares dos outros. Lá, onde o processo produtivo se desenvolve debaixo da terra, em cavernas escuras, culmina hoje nos milhões de trabalhadores anónimos que transpiram nas fábricas do Terceiro Mundo, desde os gulags chineses às linhas de montagens indonésias. Face à sua invisibilidade, o Ocidente pode dizer que a chamada classe trabalhadora está a desaparecer. A verdade é que está apenas a desaparecer daqui. (Slavoj Zizek)
Acossados por governos politicamente indigentes e ao serviço do neo-liberalismo, os trabalhadores europeus (portugueses, espanhois,gregos) engrossam o exército mundial de reserva e manifestam, no quotidiano das suas existências, a repulsa por uma política de terra queimada dirigida a aprofundar o abismo entre as condições de vida dos países ricos e pobres, e estimular o conformismo, o espírito de rebanho, e a decisão de migrar - última oportunidade para se libertar da espiral de miséria e reencontrar a esperança de viver com dignidade.
As políticas de austeridade aplicadas simultaneamente na maior parte dos países da União Europeia contribuem para a espiral recessiva mundial.
A Primavera árabe foi o rastilho que nos devolveu a confiança em nós e na capacidade colectiva para mudar a actual ordem de coisas e romper com o cepticismo, a resignação e a apatia dominantes
Este fenómeno, transversal a todos os continentes, despertou para a luta milhões de trabalhadores até então mergulhados numa passividade ultraconservadora. Se o capitalismo é global , consequentemente, as resistências ao mesmo tem que ser globais, internacionalistas e solidárias.
O futuro dos trabalhadores e dos jovens depende, na opinião de François Chesnais, em grande medida, senão inteiramente, da capacidade para abrir espaços e criar “tempos de respiração” políticos próprios, a partir de dinâmicas que hoje só eles podem mobilizar. Estamos numa situação mundial na qual o decisivo passou a ser a capacidade destes movimentos – nascidos sem aviso – se organizarem de tal modo que conservem uma dinâmica de “autoalimentação”, inclusive em situações nas quais não existam, no curto prazo, desenlaces políticos claros ou definidos.
O nosso futuro, depende da nossa acção enquanto cidadãos atentos. Todas as mudanças transformadoras da sociedade, sempre foram produto de lutas assumidas, muitas vezes, por pequenos grupos sem expressão eleitoral.
Sem a iniciativa dessas minorias, enquanto agentes mobilizadores da sociedade, não há mudança possível. Estas lutas, em nome das legitimas preocupações dos cidadãos, acabam por arrastar as “maiorias silenciosas”, (no início), até serem consagradas pelo voto universal, que sempre vem depois – nunca antes – da vitória, como afirma Samir Amin.
Os direitos humanos pressupõem precisamente que somos alguém independentemente do nosso lugar em oposição à metáfora organicista do fascismo onde a chave para manter a ordem é que cada pessoa permaneça no seu lugar, sendo que as coisas correm mal quando as pessoas querem participar directamente na dimensão universal.
Hoje em dia ninguém fala da classe trabalhadora, mas existe, apesar de tudo, outro termo – trabalhadores imigrantes, imigrantes que funciona como uma espécie de deslocamento metafórico. (Slavoj Zizek)
Nota: Inicialmente publicada no Lugar de Exílio

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

A RECESSÃO E O FMI



Os defensores do FMI querem fazer crer que o fim da recessão é testemunha da eficácia das políticas do Fundo. Bobagem. Toda a recessão acaba algum dia. Tudo que o FMI fez foi agravar as recessões tornando-as mais profundas, mais prolongadas e mais difíceis (Joseph Stiglitz ex-economista chefe do Banco Mundial).

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

MUNDIALIZAÇÃO



Atrás da expressão neutra da “mundialização da economia” e seu corolário já mais explícito da “vitória do mercado”, esconde-se um modo específico de funcionamento e de dominação política e social do capitalismo. O termo “mercado” é a palavra que serve hoje para designar pudicamente a propriedade privada dos meios de produção (Chesnais)

A CRISE ESTRUTURAL DO CAPITAL



Crise dos subprime, crise especulativa, crise bancária, crise financeira – os nomes são muitos para a imensa expansão da aventura especulativa, que abalou o capital financeiro e, naturalmente os ramos produtivos das economias. Em resposta, governos e instituições globais jogam triliões de dólares no sistema, ao passo que os indicadores económicos sinalizam o aprofundamento da deterioração na chamada ‘economia real’. 
É inócua a ação de governos e instituições globais que inundam a economia com triliões e clamam pelo retorno da “confiança”. A partir de uma visão histórica e sistémica sobre a crise do capital, István Mészáros mostra que esta crise nada tem de nova. Pelo contrário, é endémica, cumulativa, crónica e permanente; e suas manifestações são o desemprego estrutural, a destruição ambiental e as guerras permanentes.
A grande crise económica mundial de 1929 – 1933 se parece com "uma festa no salão de chá do vigário" em comparação com a actual crise financeira. A crise estrutural do sistema do capital como um todo está destinada a piorar consideravelmente. Vai se tornar a certa altura muito mais profunda, no sentido de invadir não apenas o mundo das finanças globais mais ou menos parasitárias, mas também todos os domínios da nossa vida social, económica e cultural. 
Pela primeira vez na história, o capitalismo confronta-se globalmente com seus próprios problemas, que não podem ser “adiados” por muito mais tempo nem, tão pouco, transferidos para o plano militar a fim de serem “exportados” como guerra generalizada. (in “A Crise Estrutural do Capital” de István Mészáros)

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

A LINGUÍSTICA E O NEOLIBERALISMO

É no território da linguística de um neoliberalismo pronto a servir, que habitam a mentira, a demagogia e uma dimensão totalitária e indecorosa da política. É pois desejável ressignificar as coisas, o mundo e a sociedade, pugnando pela construção de um modo alternativo ao modelo neoliberal, numa época em que a distinção entre capitalismo e democracia parece ter sido esbatida e a liberdade reduzida a uma estratégia de mercado

MANIFESTAÇÕES POPULARES



A finalidade dessas manifestações não é, verdadeiramente, propor um sistema de governação alternativo nem um conjunto de políticas, mas apenas dizer que há certos valores — como a democracia, a abertura, a transparência, a preocupação com os pobres, a apreensão quanto ao ambiente — que muitas pessoas, especialmente os jovens, consideram não estarem a ser correctamente levados em conta no actual sistema de governação global (Joseph Stiglitz ex-economista chefe do Banco Mundial).

AUSTERIDADE FISCAL E MONETÁRIA




No contexto da crise do Leste asiático e de outras crises, diz que o que é importante é a austeridade fiscal e monetária. Preocupa-se mais com o impacte ao nível dos investidores estrangeiros do que com a fuga de capitais de investidores nacionais. Pouco se preocupa com o impacte na economia da agitação social e política gerada pelas políticas adoptadas. Vou referir apenas um exemplo: em finais de 1997, muitos de nós dissemos que as políticas de extrema austeridade que o FMI estava a impor à Indonésia iriam, muito provavelmente, causar problemas reais de agitação social numa sociedade que já tinha antecedentes desse tipo e que estava etnicamente fragmentada. O FMI não prestou qualquer atenção a essas advertências. Com efeito, fez ainda pior. Numa altura em que a taxa de desemprego estava a aumentar acentuadamente — aumentou dez vezes — e os salários reais estavam em queda (baixaram cerca de um terço) decidiu agravar a situação, suspendendo os subsídios de alimentação e de combustíveis concedidos às pessoas mais pobres. Foi deitar achas para uma fogueira que estava prestes a deflagrar e que, efectivamente, deflagrou no dia seguinte. (Joseph Stiglitz ex-economista chefe do Banco Mundial).

PRINCIPAIS OBJECTIVOS DA CRIAÇÃO DO FMI




Um dos principais objectivos que presidiram à criação do FMI foi aumentar a estabilidade e promover a adopção de políticas de expansão pelos governos dos países que se encontravam perante uma situação de declínio económico. Essas políticas de expansão permitiriam que os declínios fossem menos acentuados e menos prolongados do que normalmente seriam. Hoje em dia, quando o FMI intervém num país cuja economia está em declínio, o que lhe diz não é que adopte uma política de expansão, mas sim de contracção. (Joseph Stiglitz ex-economista chefe do Banco Mundial).