A apologética da política económica neoliberal rege-se por uma teia de conotações e associações de palavras como flexibilidade, maleabilidade, desregulamentação, reajustamentos, reformas estruturais, que tendem a fazer crer que a mensagem neoliberal é, usando as palavras de Pierre Bourdieu, “uma mensagem universalista de libertação”.

domingo, 14 de outubro de 2012

ISLÂNDIA MOSTROU O CAMINHO: RECUSAR A AUSTERIDADE



– Recusou receituário do FMI, deixou bancos falirem e condenou responsáveis pela crise 

– Por que pouco se fala da Islândia nos media portugueses que se auto-proclamam como "referência"?



Quando, em Setembro de 2008, a crise económica e financeira atingiu a Islândia – pequena ilha no Atlântico com 320 mil habitantes –, o impacto foi desastroso, tal como no resto do continente. A especulação financeira levou à falência os três principais bancos, cujo total de activos era dez vezes superior ao PIB do país. A uma perda líquida foi de 85 mil milhões de dólares. A taxa de desemprego aumentou nove vezes entre 2008 e 2010, ao passo que antes o país gozava de pleno emprego.

A dívida da Islândia representava 900% do PIB e a moeda nacional desvalorizou-se 80% em relação ao euro. O país caiu numa profunda recessão, com uma diminuição do PIB de 11% em dois anos. [1]

Diante da crise 

Em 2009, quando o governo pretendeu aplicar as medidas de austeridade exigidas pelo FMI em troca de uma ajuda financeira de 2,1 mil milhões de euros, uma forte mobilização popular o obrigou a renunciar. Nas eleições antecipadas, a esquerda ganhou a maioria absoluta no Parlamento. [2]

No entanto, o novo poder adoptou a lei Icesave – cujo nome provém do banco online que foi à bancarrota e cujos depositantes eram, na maioria, holandeses e britânicos – destinada a reembolsar os clientes estrangeiros. Essa legislação obrigava os islandeses a reembolsarem uma dívida de 3,5 mil milhões de euros (40% de seu PIB) – nove mil euros por habitante – ao longo de quinze anos e com uma taxa de juros de 5%. Diante dos novos protestos populares, o presidente recusou-se a promulgar a lei aprovada pelo parlamento e submeteu-a a um referendo. Em Março de 2010, 93% dos islandeses recusaram a lei do reembolso das perdas do Icesave. Quando submetida novamente a referendo, em Abril de 2011, 63% dos cidadãos voltaram a rejeitá-la. [3]

Uma nova Constituição, redigida por uma Assembleia Constituinte de 25 cidadãos eleitos por sufrágio universal entre 522 candidatos, composta por nove capítulos e 114 artigos, foi adoptada em 2011. Ela prevê o direito à informação, com acesso público aos documentos oficiais (Artigo 15), a criação de uma Comissão de Controle da Responsabilidade do Governo (Artigo 63), o direito à consulta directa (Artigo 65) – 10% dos eleitores podem pedir um referendo sobre as leis votadas pelo Parlamento –, assim como a nomeação do primeiro-ministro pelo Parlamento. [4]

Assim, ao contrário das outras nações da União Europeia na mesma situação, que aplicaram ao pé da letra as instruções do FMI exigindo medidas de austeridade severas, como na Grécia, Irlanda, Itália ou Espanha, a Islândia escolheu uma via alternativa. Quando, em 2008, os três principais bancos do país – Glitnir, Landsbankinn e Kaupthing – desmoronaram, o Estado islandês recusou-se a neles injectar fundos públicos, tal como havia feito o resto da Europa. Em vez disso, efectuou sua nacionalização.

Do mesmo modo, os bancos privados tiveram que cancelar todos os créditos hipotecários com taxas variáveis que superassem 110% do valor dos bens imobiliários, o que evitou uma crise de subprime como nos Estados Unidos. Por outro lado, a Corte Suprema declarou ilegais todos os empréstimos indexados a divisas estrangeiras que haviam sido concedidos a particulares, obrigando assim os bancos a renunciarem a seus créditos em benefício da população. [5]

Quanto aos responsáveis pelo desastre – os banqueiros especuladores que provocaram o desmoronamento do sistema financeiro islandês –, não foram beneficiados com a mansidão verificada no resto da Europa, onde foram sistematicamente absolvidos. Com efeito, Olafur Thor Hauksson, Procurador Especial nomeado pelo Parlamento, processou-os e prendeu-os, inclusive ao ex-primeiro-ministro Geir Haarde. [6]

Uma alternativa à austeridade 

Os resultados da política económica e social islandesa têm sido espectaculares. Enquanto a União Europeia se encontra em plena recessão, a Islândia apresentou uma taxa de crescimento de 2,1% em 2011 e prevê uma taxa de 2,7% para 2012, além de uma taxa de desemprego de 6%. [7] O país até se deu ao luxo de realizar o reembolso antecipado de suas dívidas ao FMI. [8]

O presidente islandês Olafur Grímsson explicou este milagre económico: "A diferença é que, na Islândia, deixamos os bancos quebrarem. Eram instituições privadas. Não injectámos dinheiro para salvá-las. O Estado não tem porque assumir essa responsabilidade". [9]

Agindo contra seus próprios prognósticos, o FMI saudou a política do governo islandês – o qual aplicou medidas totalmente contrárias àquelass que o Fundo preconiza –, que permitiu preservar "o precioso modelo nórdico de protecção social". De fato, a Islândia dispõe de um índice de desenvolvimento humano elevado. "O FMI declara que o plano de resgate ao modo islandês oferece lições nos tempos de crise". A instituição acrescenta que "o facto de que a Islândia tenha conseguido preservar o bem-estar social das unidades familiares e conseguir uma consolidação fiscal de grande envergadura é uma das maiores conquistas do programa e do governo islandês".

No entanto, o FMI omitiu a informação de que tais resultados só foram possíveis porque a Islândia recusou sua terapia de choque neoliberal e elaborou um programa de estímulo económico alternativo e eficaz. [10]

O caso da Islândia demonstra que existe uma alternativa crível às políticas de austeridade que são impostas na Europa. Estas, além de serem economicamente ineficazes, são politicamente custosas e socialmente insustentáveis. Ao colocar o interesse geral acima do interesse dos mercados, a Islândia mostrou ao resto do continente o caminho para escapar do beco sem saída. 
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

terça-feira, 9 de outubro de 2012

FMI RECONHECE ERRO - AUSTERIDADE AGUDIZOU CRISE NA EUROPA



Dois anos depois de violentos programas de austeridade terem lançado a maioria dos países europeus na recessão, originando um mar de desempregados e o aumento em cascata do endividamento público, o Fundo Monetário Internacional veio reconhecer que “subestimou” o efeito recessivo gerado pela austeridade.
O “erro”, reconhece agora o FMI no relatório semestral sobre o estado da economia mundial, estava nos modelos económicos utilizados para calcular os efeitos da política de austeridade na economia. Num estudo intitulado "Estaremos a subestimar os multiplicadores orçamentais de curto prazo?", os economistas do Fundo tentam perceber porque razão as previsões para a evolução da economia têm falhado sistematicamente.
Enquanto nos cálculos efetuados para definir o programa seguido nos memorandos para Portugal, Grécia ou Irlanda, se previa uma diminuição de 0,5 euros na riqueza do país por cada euro a mais nos impostos ou de corte na despesa pública, o FMI reconhece agora que esse impacto é muito superior. Assim, desde o início da crise financeira de 2008, o produto dos países europeus está a diminuir entre 0,9 e 1,7 euros por cada euro retirado à despesa do Estado.
O “mea culpa” do FMI surge dois anos depois de esta intuição ter reconhecido o papel dos seus modelos no deflagrar da crise financeira que levou à atual recessão.
"Esta descoberta é consistente com investigação que sugere que, no actual ambiente de fraca utilização da capacidade produtiva, de política monetária limitada pelas taxas de juro zero e de ajustamento da política orçamental simultâneo em vários países, os multiplicadores podem estar bem acima de um", defende-se no relatório do FMI.
O que o relatório do FMI escamoteia é que os cálculos utilizados pela instituição sempre foram contestados por um sem número de economistas, como os prémios Nobel Paul Krugman ou Stiglizt, por não levarem em consideração o impacto recessivo da austeridade.
O certo é que um erro tão grosseiro no cálculo do efeito das medidas de austeridade, e com uma dimensão que chega mesmo a ser surpreendente, teve impacto nas economias europeias, principalmente das que estão intervencionadas pela Comissão Europeia e FMI (como é o caso de Portugal). Retirado de esquerda.net

quarta-feira, 18 de abril de 2012

ARGENTINA RECUPERA YPF A (Yacimientos Petrolíferos Fiscales)

Ante o alarido em torno da recuperação da YPF, Cristina Fernández de Kirchner afirmou que apresentou o projeto para a recuperação da soberania de hidrocarbonetos porque “somos quase o único país do mundo que não maneja os seus recursos naturais”, e assinalou que, desde 1999 até 2011, “o lucro líquido da YPF foi de 16,45 bilhões de dólares, e que a empresa distribuiu dividendos de 13,246 bilhões de dólares. “O problema foi a desnacionalização”, acrescentou.
Mas é de se perguntar porque, face ao comportamento predatório daquela multinacional, o governo argentino levou tantos anos para avançar com esta decisão. Quem tiver alguma dúvida acerca deste comportamento que assista ao filme "La memoria del saqueo"

sábado, 14 de abril de 2012

REBELIÃO FISCAL: O EXEMPLO IRLANDÊS


A rebelião fiscal já começou, na Irlanda. Depois de quatro anos de crise contínua, o governo de Dublin enfrenta o boicote fiscal dos cidadãos. Metade dos contribuintes aos quais era exigido uma taxa extraordinária de 100 euros por habitação não efectuaram o pagamento até à data limite de 31 de Março. O movimento de boicote foi liderado por nove deputados da "Aliança Esquerda Unida" e alguns independentes.
Ver artigo a respeito publicado no Jornal de Negócios

sexta-feira, 23 de março de 2012

IRLANDA, O BOM ALUNO DA AUSTERIDADE NÃO ESTÁ BEM

 
Promessa de rápida recuperação alimentada pelo crescimento das exportações chocou-se com a desaceleração global da economia. Na Zona Euro, Irlanda, Bélgica, Holanda, Itália, Portugal e Grécia estão em recessão.

sexta-feira, 16 de março de 2012

UM PAÍS DEVE PAGAR SUA DÍVIDA?

Para as Nações Unidas, “um Estado não poderia fechar suas escolas, suas universidades e seus tribunais e negligenciar seus serviços públicos ao ponto de expor sua população à desordem e à anarquia, simplesmente para dispor dos fundos necessários para cumprir com suas obrigações em relação a seus credores estrangeiros”.

Antigamente, havia, o Primeiro Mundo, o “Norte”, supostamente constituído por um bloco de prosperidade; o Segundo Mundo, aquele dos países soviéticos; e, por fim, o Terceiro Mundo, reagrupando os países pobres do Sul e submetidos desde os anos 1980 às regras do FMI. O segundo desapareceu no início dos anos 1990 com a dissolução da União Soviética. Com a crise financeira de 2008, o Primeiro Mundo se transformou, tanto que atualmente nenhuma divisão geográfica parece pertinente. São distinguíveis apenas duas categorias de população: um punhado que tira proveito do capitalismo contemporâneo e a grande maioria, que o sustenta. Sobretudo pelo mecanismo da dívida. (Análise de Damien Millet, Eric Toussaint  que pode ser lida aqui)

segunda-feira, 12 de março de 2012

PARAÍSOS FISCAIS,OS PROSTÍBULOS DO CAPITALISMO


Os chamados “paraísos fiscais” são verdadeiros prostíbulos do capitalismo. Nesses territórios se praticam todos os tipos de actividade económica que seriam ilegais em outros países, captando e limpando somas milionárias de negócios como o comércio de armamentos, do narcotráfico e de outras actividades similares.
Os paraísos fiscais, que devem somar um total entre 60 e 90 no mundo, são micro-territórios ou Estados com legislações fiscais frouxas ou mesmo inexistentes. Uma das suas características comuns é a prática do recebimento ilimitado e anónimo de capitais. São países que comercializam sua soberania oferecendo um regime legislativo e fiscal favorável aos detentores de capitais, qualquer que seja sua origem. Seu funcionamento é simples: vários bancos recebem dinheiro do mundo inteiro e de qualquer pessoa que, com custos bancários baixos, comparados com as médias praticadas por outros bancos em outros lugares.
Eles têm um papel central no universo das finanças negras, isto é, dos capitais originados de actividades ilícitas e criminosas. Máfias e políticos corruptos são frequentadores assíduos desses territórios. Segundo o FMI, a limpeza de dinheiro representa entre 2 e 5% do PIB mundial e a metade dos fluxos de capitais internacionais transita ou reside nesses Estados, entre 600 bilhões e 1 trilião e 500 bilhões de dólares sujos circulam por aí.
O numero de paraísos fiscais explodiu com a desregulamentação financeira promovida pelo neoliberalismo. As inovações tecnológicas e a constante invenção de novos produtos financeiros que escapam a qualquer regulamentação aceleraram esse fenómeno.
Trafico de armas, empresas de mercenários, droga, prostituição, corrupção, assaltos, sequestros, contrabando, etc., são as fontes que alimentam esses Estados e o mecanismo de limpeza de dinheiro.
Um ministro da economia da Suíça – dos maiores e mais conhecidos paraísos – declarou em uma visita a Paris, defendendo o segredo bancário, chave para esses fenómenos: “Para nós, este reflecte uma concepção filosófica da relação entre o Estado e o indivíduo.” E acrescentou que as contas secretas representam 11% do valor agregado bruto criado na Suíça.
Em um país como Liechtenstein, a taxa máxima de imposto sobre a renda é de 18% e o sobre a fortuna inferior a 0,1%. Ele se especializa em abrigar sociedades holdings e as transferências financeiras ou depósitos bancários. 
Uma sociedade sem segredo bancário, em que todos soubessem o que cada um ganha – poderia ser chamada de paraíso. Mas é o contrário, porque se trata de paraísos para os capitais ilegais, originários do narcotráfico, do comércio de armamento, da corrupção.
Existem, são conhecidos, quase ninguém tem coragem de defendê-los, mas eles sobrevivem e se expandem, porque são como os prostíbulos – ilegais, mas indispensáveis para a sobrevivência de instituições falidas, que tem nesses espaços os complementos indispensáveis à sua existência.
Publicado por Emir Sader

ISLÂNDIA INICIOU O JULGAMENTO DO NEOLIBERALISMO


Geir Haarde, primeiro ministro da Islândia em 2008, quando se deu a derrocada bancária no país, está a ser julgado por um tribunal especial. No banco dos réus está pela primeira vez a política neoliberal que originou a bancarrota.
Durante o governo de coligação direitista e social democrata de Geir Haarde, os bancos faliram, a economia entrou em colapso. Mais do que julgar o homem que à frente do governo não conseguiu evitar a dramática situação no pequeno país, os juízes tentam apurar o que se passou e as circunstâncias que provocaram a crise. O tribunal considera que não é possível responsabilizar unicamente o ex-primeiro ministro pelo que se passou.
Da sua acusação constam o facto de não ter feito nada para evitar a debandada dos estabelecimentos financeiros, de não feito com que o banco online Icesave tivesse o estatuto de filial britânica, o que teria permitido transferir o problema da falência para Londres e evitado ao país a realização de dois referendos e a decisão dos islandeses de se recusarem a pagar por dívidas que não são suas. Este problema está actualmente no Tribunal Europeu de Justiça.
Juízes e cerca de 60 testemunhas têm reflectido durante o julgamento – que não é transmitido em directo pela TV mas está a ser seguido por milhares de islandeses através da internet – sobre as causas de uma situação que não surgiu em 2008 por geração espontânea mas sim pela deriva neoliberal a que o governo sujeitou o país.
Em causa estão, principalmente, a privatização das quotas de pesca que proporcionou aos armadores fortunas incalculáveis, um investimento em cascata no estrangeiro, quase sempre com maus resultados, uma privatização desastrosa dos bancos feita frequentemente segundo métodos corruptos e de clientelismo. A este processo seguiu-se uma onda de concessão de créditos bancários sem critérios nem garantias proporcionando, à escala do país, problemas semelhantes aos que se registaram nos Estados Unidos com a bolha imobiliária e o subprime.
Nesta fase, os bancos concederam um volume global de crédito que superou em 11 vezes o PIB islandês; quando o primeiro-ministro decretou a sua falência era impossível salvá-los. Além disso, os islandeses não o permitiram e recusaram-se a assumir as dívidas alheias.
A resposta dos islandeses à crise não alinhou pelos caminhos impostos pela União Europeia aos Estados membros, pelo que hoje a Islândia, apesar de sofrer os efeitos de uma forte austeridade económica e de uma acentuada quebra no consumo, conseguiu salvaguardar o Estado social, o desemprego está em sete por cento e as entidades patronais não foram além de limitar o trabalho extraordinário para conseguirem evitar os despedimentos.
Geir Haarde, político direitista e considerado um fundamentalista neoliberal, tem 64 anos e abandonou a carreira política. Incorre numa pena de dois anos de prisão. Mais do que um chefe de governo incapaz de dirigir o país – é a acusação a que corresponderá a pena que vier a ser aplicada – no banco dos réus está a política neoliberal.(Publicado aqui)

sexta-feira, 9 de março de 2012

SETE PRINCIPIOS PARA LIBERTAR A SOCIEDADE DO DOMINIO DOS MERCADOS FINANCEIROSmercados financeiros - Rede Europeia da ATTAC



Desde 2007, a crise financeira mundial está a abalar o Mundo. A União Europeia está no seu epicentro. As suas políticas económicas estão a aprofundar as crises sociais, económicas e ecológicas, colocando a democracia em risco.
O Banco Central Europeu (BCE) e o Euro são os símbolos dessas políticas que estão a entregar o controlo da economia aos bancos privados e aos mercados financeiros, a pretexto de uma suposta crise das dívidas públicas.
Ao mesmo tempo, a Troika (BCE, Comissão Europeia e FMI) e os Governos da UE estão a destruir o bem-estar social e a impor medidas de austeridade destrutivas, obrigando as pessoas a pagar dívidas pelas quais não são responsáveis.
O modelo neoliberal da integração europeia agravou as diferenças entre os países periféricos e os do centro, e aumentou as desigualdades dentro e fora da Europa ao encorajar o dumping social, ambiental e fiscal.
Os Governos da UE deram mais um passo no sentido de destruir a democracia, ao impor aos seus Povos e Parlamentos processos tecnocráticos, chegando mesmo a instalar os seus próprios representantes (Grécia e Itália), de modo a colocar em prática processos destrutivos de redução de dívida. O funcionamento democrático da UE está também colocado em causa pela criação do ‘Grupo de Frankfurt’ – constituída pela chanceler da Alemanha, o presidente de França, o governador do BCE, o presidente do Eurogrupo, a directora-geral do FMI e os dois presidentes da UE -, que definem as linhas políticas estratégicas em nome da urgência da crise. Assim, a já frágil legitimidade da UE e os seus processos de decisão ficam cada vez mais debilitados.
A Rede Europeia da ATTAC opõe-se fortemente a este método de integração europeia e aos moldes como o Euro existe, pois subordinam os interesses e necessidades dos Povos aos interesses dos mercados financeiros.
A dicotomia entre sair do Euro ou aprofundar a presente forma de integração europeia não abarca os principais elementos da crise global. É urgente libertar a Europa e os Povos da domínio dos mercados financeiros e promover, de forma coordenada, um conjunto de políticas económicas, sociais, monetárias e ecológicas progressivas. Para isso, os cidadãos e os movimentos sociais devem esforçar-se a nível local e europeu para alterar as regras do sistema económico e institucional vigente – e tornar outra Europa possível.
Para libertar as nossas sociedades do domínio dos mercados financeiros e coordenar políticas económicas, monetárias, sociais e ecológicas progressivas, devemos defender os seguintes sete princípios:
Retirar as finanças públicas dos mercados financeiros: permitir financiamentos públicos democráticos, através de um Banco Central controlado democraticamente, que financie directamente os Estados;
Sair da armadilha da dívida: acabar com as políticas de austeridade e avançar com processos de auditoria que levem a cancelamentos da dívida. Os bancos e os agentes financeiros privados devem também assumir perdas;
Dar às finanças públicas uma base sustentável: aumentar os impostos sobre os ricos e os lucros das grandes empresas e harmonizar os impostos a nível a nível europeu para erradicar o dumping fiscal;
Desarmar os mercados financeiros e colocar os bancos sob controlo público: proibir movimentos especulativos prejudiciais (por exemplo, vendas de curto prazo, especulação nos produtos derivados, movimentos over-the-counter, trocas de alta frequência), e impor uma taxa de pelo menos 0,1% a todas as transacções financeiras. Regular de forma sólida os bancos (separar a banca comercial da banca de investimento, desmantelar os bancos ‘demasiado grandes para caírem’);
Permitir o financiamento público e democrático da economia: criar um sector bancário cooperativo e público que esteja sob o controlo democrático, para garantir o financiamento das necessidades sociais e económicas, garantir os direitos sociais e financiar um transição ecológica. As políticas de comércio internacional devem ser revistas para cumprirem estes objectivos, em cooperação com os países em vias de desenvolvimento.
Uma Europa para os Povos, não para os lucros: promover políticas económicas e sociais a nível europeu e recuperar e expandir os serviços públicos, para reduzir desequilíbrios, promover a transição ecológica das economias, garantir altas taxas de emprego, promover a igualdade de género e expandir os direitos económicos e sociais básicos (saúde, educação, habitação, informação, cultura, bem-estar social, etc) e garantir que são assegurados por uma rede 100% pública.
Democracia Já: Iniciar um processo constituinte de modo a democratizar os processos de decisão a todos os níveis; elaborar democraticamente um novo Tratado europeu ratificado em referendos realizados em todos os países e apoiar e promover um debate público e transparante sobre caminhos para a Europa e políticas alternativas para a UE.
Publicado por Attac Portugal

quinta-feira, 8 de março de 2012

GRÉCIA: MERCADOS FESTEJAM O FUNERAL DE UMA NAÇÃO


Mercados e bolsas festejam o acordo fechado nesta 5ª feira entre a Grécia e os bancos credores, que concederam ao país um desconto médio de 50%, em troca de garantias e reformas que asseguram o pagamento do passivo restante.
Há razões para a banca comemorar: a adesão dos bancos ao desconto de 50% representa, no fundo, o oposto do que transparece. Trata-se de uma gigantesca transfusão, talvez a mais radical desde o Tratado de Versalhes, do sangue de um povo a credores pantagruélicos. Uma derrota superlativa da democracia grega, que marcará a história do país por décadas; e provavelmente destruirá seu sistema representativo pela traição nacional maiúscula.
As eleições parlamentares de abril agora podem marcar o início dessa bancarrota partidária. O processo consumado nesta 5ª feira compromete a vida da atual geração, a dos seus filhos e a dos netos que um dia eles terão. Em troca de um desconto sobre uma dívida impagável -- contraída num intercurso entre governos irresponsáveis e banqueiros cúmplices-- o Estado grego assinou uma espécie de testamento à favor dos mercados. Em seguida, consumou o suicídio político da democracia. A partir de agora, e por prazo indeterminado, a Grécia assume o papel de protectorado da banca.
Um diretório nomeado pelos mercados terá poderes legais de monitorar a tosquia do país, com direito a vetar orçamentos e redirecionar recursos prioritariamente ao pagamento de banqueiros. O que a coalizão social-democrata e conservadora fez foi acordar um álibi internacional para sancionar um arrocho salarial indecente -o salário mínimo foi ineditamente reduzido e, como ele, as pensões; bem como demissões maciças da ordem de 150 mil funcionários públicos (15 mil efetuadas este ano); privatizações e cortes na saúde e educação que já desencadearam surtos de suicídios, fome nas escolas e entrega de crianças a orfanatos por famílias desesperadas.
Compare-se com o que fez a Argentina de Kirchner há nove anos para se ter a medida da regressividade acatada por Atenas. Em 2003, a Argentina era uma espécie de Grécia da América do Sul. Desacreditada aos olhos de seu próprio povo, balançava como um 'joão bobo' nas mãos do capital especulativo interno e externo. Nestor Kirchner herdou do extremismo neoliberal uma taxa de pobreza de 60% sobre uma população de 37 milhões de argentinos.
A dívida de US$ 145 bilhões, impagável, corroía seu sistema financeiro. Os credores sobrevoavam a nação argentina à espera do melhor momento para arrancar os seus olhos e o que lhe restasse ainda da carne, como fizeram nesta 5ª feira com a Grécia. O cerco internacional era avassalador. A diferença é que Nestor Kirchner não se dobrou: impôs um desconto de 70% da dívida aos credores; desvalorizou o câmbio, congelou tarifas, destinou a receita crescente a programas sociais e de fomento.
A taxa de pobreza recuou a 10% da população. A economia argentina foi a que mais cresceu no hemisfério ocidental na última década. Cristina foi reeleita em 2011 com apoio esmagador. Os desdobramentos virtuosos desse braço de ferro são espertamente omitidos pela crítica conservadora que tenta desmerecer os ganhos econômicos e sociais da soberania argentina. E o faz por uma razão compreensível: eles realçam as dimensões catastróficas dos desastres em marcha na Grécia, Espanha, Portugal e outros, ora submetidos à dose dupla de um purgante ortodoxo inútil, que o êxito da Argentina derrotou e desmoralizou.
Publicado em Carta Maior

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

ACERCA DO PESO DO ESTADO EM PORTUGAL


por Daniel Vaz de Carvalho
1. A ladainha neoliberal reza assim: "O peso do Estado em Portugal é excessivo, a carga fiscal excessiva. O Estado asfixia a economia privada consumindo demasiados recursos. Por isso o país não pode crescer nem desenvolver-se". O peso do Estado em percentagem do PIB seria, pois, demasiado elevado para o nosso país. Dado este mote, os comentadores do costume fazem na praça pública o "responsório".
Por consequência, há que reduzir o "peso do Estado". Verdadeiro? Falso? Nem uma coisa nem outra: é um primarismo. É como querer tratar de um membro ferido procedendo á sua amputação, como era comum ainda no século XIX.
Vejamos porquê na tabela seguinte: [1]

Países Despesa Publica % PIB Crescimento entre 2001 e 2010 Défice Público % PIB Despesa pública por habitante (€)


[*] Países com a classificação AAA mantida recentemente pela S & P
Podemos verificar:
- Portugal é dos países cujo peso do Estado é dos mais baixos neste grupo da UE.
- A despesa pública por habitante em Portugal é de longe a mais baixa
- Portugal é o segundo país com menor crescimento ao longo da década
- Países com elevada despesa pública tiveram melhor ou muito melhor desempenho económico.
-Países como a Alemanha não têm uma despesa pública em termos de percentagem do PIB muito diferente da de Portugal.
- Não se verifica uma relação entre o volume de despesa pública e o respectivo défice e, como se vê, os "mercados" não se preocupam muito isso.
O que podemos concluir? Na realidade, apenas que as afirmações que suportam as políticas de direita não têm qualquer sentido. A questão pode resumir-se a isto: não é o volume da despesa pública que conta é a qualidade da mesma.
As alegações, contra o "peso do Estado" que comandam as políticas de direita caiem, pois, no domínio da superstição. Uma superstição consiste em atribuir a certas práticas uma espécie de poder mágico, uma eficácia sem razão. Superstição é uma crença sem fundamento em efeitos mágicos de determinadas acções ou rituais. Assim a crença no poder regulador do mercado livre ou a crença nos efeitos negativos do peso do Estado na economia, não passam de superstições. Porém, como diz quem sabe, a superstição tem a particularidade de não ser anulada pela experiência…
Note-se que o grande capital financeiro e monopolista, não tem como objectivo enfraquecer o Estado como instrumento de intervenção, mas sim de o colocar cada vez mais e por completo ao seu serviço, como, por exemplo, fazer uma distribuição fiscal activa retirando aos pobres e classes médias para financiar as prendas fiscais dadas à banca e aos grandes grupos económicos. [2]
A designação "peso do Estado" já de si é manipuladora e preconceituosa. Não se fala no peso da finança especuladora, nem no peso de monopólios e oligopólios na economia e das rendas que obtêm do Estado, nem no peso da saída de capitais e rendimentos do país. Nem a "insustentável leveza" com que os grandes grupos económicos, monopólios e oligopólios, deixam o país transferindo as suas sedes para o exterior pagando não aqui os impostos devidos embora a sua riqueza seja cá criada! Só o Estado é que é pesado! Temos de defender os interesses dos nossos accionistas – dizem – ou seja, deles próprios! Quanto aos interesses do país, que importa isso?
Nestas circunstâncias as criticas que os comentadores de serviço por vezes fazem ao governo ou à UE por não haver medidas que promovam o crescimento, vindas de quem sempre defendeu as políticas neoliberais que nos são impostas e passa o tempo atacar o "peso do Estado", tornam-se no mínimo votos piedosos, para não dizer ridículos ou hipócritas.
2. Uma das características dos agressores mais cruéis é fazerem com que as próprias vítimas se sintam culpadas. Este papel cabe, em relação aos povos da UE, em primeiro lugar ao BCE através das suas políticas iníquas de ataque ao "peso do Estado". Os governos da submissão funcionam como executores dóceis. A finança especuladora esquece porém uma regra fundamental da biologia: é que com a morte do hospedeiro morre o parasita, morre o vírus. É isto que está a acontecer na UE e muito em particular na eurozona.
Vejamos como este vírus pró-finança e anti-Estado democrático, se insinua.

A seguinte expressão (ou equivalente) é ensinada e divulgada:
PIB = Consumo+ Investimento + Despesas do Estado + Saldo da Balança de Transacções
Assim, quanto maior for a Despesa do Estado, menor Investimento, menor Consumo.

Uma outra expressão, relaciona o investimento a poupança e o défice do Estado
Investimento = Poupança – Défice do Estado – Saldo da Balança de Transacções
Portanto quanto maior for a Despesa do Estado menor rendimento disponível dos privados e menor Investimento.
O Estado é assim transformado em inimigo público número um: quanto menor o "peso do Estado" melhor. Certo? Não, errado.
A expressão é falaciosa e destina-se a mostrar que o Estado deve retirar-se das actividades económicas produtivas para estas serem geridas de forma privada que gera Lucro e portanto Consumo e Investimento. Porém:

– Na Despesa Pública há Investimento e Consumo. O modelo considera apenas investimento privado. Na realidade a Despesa do Estado, seguindo adequadas políticas de desenvolvimento e controlo da economia, corresponde a:
Despesas do Estado = despesas públicas + prestações sociais.
Portanto: Despesas do Estado = Consumo Público + Investimento público + Prestações sociais

– A Poupança privada contém uma parte apreciável de transferência de rendimentos para o estrangeiro que não está considerada, descapitalizando o país de recursos para Consumo e Investimento.
– O próprio Consumo Público, proporciona a dinamização económica se houver uma política orientada nesse sentido – diríamos de "Portugal a Produzir".
O Lucro privado, além da componente de saída de capitais e rendimentos do país particularmente no sector mono e oligopolista, embora gerando Consumo não é difícil admitir este tem uma maior componente importada que o Consumo resultante da generalidade dos salários.
- Considerando que o rendimento disponível para a sociedade é Rd = R – Im (sendo Im os impostos) e que este Rd se distribui por consumo C e investimento I (ou mais propriamente consumo e poupança) teremos em termos de taxas em relação a R: rd = 1 – t (t será a taxa de impostos sobre R). Isto é, quanto maior for a taxa de impostos sobre o rendimento menos consumo, menos poupança e menos investimento haverá.
Sedutoramente lógico, não é verdade? Certamente, pois todos gostariam de pagar menos impostos. Porém, é mais uma vez falacioso. A justificação para isentar de impostos as transferências financeiras e praticamente o grande capital, tem aqui a sua base. Os impostos são assim orientados para o consumo e para o princípio do "utilizador pagador". Desta forma ilude-se:
– A função produtiva dos impostos, se devidamente orientados
– Que a redução das prestações sociais (menor "peso do Estado) é uma forma de aumentar os impostos sobre as camadas de menores rendimentos e médias.
– Que os impostos constituem uma forma de melhorar a redistribuição do rendimento; uma das bases do regime democrático
– Que os impostos têm – ou podem ter, com outras políticas – um efeito multiplicador na economia não só pelo investimento directo, mas pela melhoria do acesso à saúde e educação.
Vemos assim como o carpir dos partidos da troika pelo dinheiro dos contribuintes quando estão na oposição é completamente negado na prática logo que ocupam o poder.
Com as diatribes do menos Estado, do Estado gordo ou do "peso do Estado", as suas funções são privatizadas (constituindo-se monopólios privados) ou passadas para instâncias internacionais de burocracias não sujeitas a qualquer espécie de escrutínio democrático que assumem a defesa do grande capital especulador e das transnacionais. No essencial, a função atribuída ao Estado neoliberal resumir-se-ia ao controlo da opinião pública e massas trabalhadoras, isto é, repressão e propaganda, salpicada de uma certa caridade demagógica. Um neofascismo.
Então e o défice do Estado, não conta? – perguntar-se-á. Certamente que sim.
O défice do Estado é motivado sempre por má gestão – incompetência e corrupção - e inadequada política fiscal, sobrepondo interesses privados aos interesses colectivos.
Ao considerar-se a expressão: Despesas do Estado = Impostos + Financiamento do Défice, falseia-se a realidade omitindo que o Estado pode e deve ter rendimentos provenientes de atividades económicas designadamente nos sectores básicos e estratégicos, subtraindo-os à esfera monopolista. O aumento da dívida pública foi originada, não por despesas de carácter social mas por:
- Políticas absurdas e suicidárias da UE e do BCE. "Estúpidas", disse um ex-comissário europeu.
- Salvamento de bancos e favores ao grande capital e finança
- Privatização de sectores estratégicos e empresas lucrativas
- Políticas fiscais erradas, contraproducentes
- Corrupção e má gestão.
Acrescente-se a tudo isto a adopção de políticas ditas de austeridade (para quem?) que conduzem à estagnação e recessão económica (próciclicas).
Mesmo não recuando a Marx ou a outros economistas clássicos, desde os anos 20 do século passado que com Keynes ficou mais que provado qual o resultado negativo das políticas de "austeridade" para a resolução de crises económicas e que só políticas activas do Estado e a criação de "procura solvente" poderiam constituir uma saída.
A política de direita e extrema-direita em curso está a fazer algo aparentemente insólito: talvez a maior saída/fuga de capitais e rendimentos de que há memória. A estreiteza política do governo e a sua submissão aos ditames externos, impede-o de mudar de rumo.

Notas
[1] Fonte: Ameco , para 2010. O crescimento indicado refere-se ao PIB a preços constantes entre 2001 e 2010.
Não incluímos os países do leste da Europa dado que a análise do seu desempenho económico e social necessitaria de uma abordagem específica, que porém não alteraria no essencial o que dizemos.
[2]; São exemplos: as PPP, os fundos de pensões transferidos para o Estado, os 12 mil milhões de "ajuda"para entregar à banca a serem pagos com a "austeridade" e "rigor", as isenções e benefícios fiscais, etc, etc.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 
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sábado, 25 de fevereiro de 2012

OS ISLANDESES COLHEM OS BENEFÍCIOS DA SUA REVOLTA


Eles não estão submetidos à ditadura da UE, FMI & BCE
Os islandeses colhem os benefícios da sua revolta
– Economia da ilha cresceu 2,9% no ano passado e expandir-se-á 2,4% este ano

por Omar R. Valdimarsson [*]
Os islandeses, que em 2009 lançaram pedras ao Parlamento exigindo dos seus líderes e banqueiros uma resposta para o colapso económico e financeiro do país, agora colhem os benefícios de sua cólera. Desde o final de 2008, os bancos da ilha perdoaram empréstimos equivalentes a 13% PIB, o que facilita a carga da dívida de mais de um quarto da população, segundo um relatório publicado este mês pela Associação de Serviços Financeiros da Islândia.
"Pode-se dizer com segurança que a Islândia tem o recorde mundial no alívio da dívida das famílias", disse Lars Christensen, economista-chefe de mercados emergentes do Danske Bank, em Copenhaga. "A Islândia seguiu o exemplo clássico do que se exige em uma crise. Qualquer economista [islandês] concorda com isso".
Os passos para a ressurreição da ilha desde 2008, quando seus bancos declararam insolvência, com uma dívida de 85 mil milhões de dólares, demonstram-se eficazes. O crescimento da economia islandesa este ano superará o da zona do euro e do mundo desenvolvido, segundo estimativas da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Actualmente, custa aproximadamente o mesmo assegurar a não quebra da Islândia do que um possível problema de crédito na Bélgica. A maioria das pesquisas mostra agora que os islandeses não querem aderir à União Europeia, submersa em seu terceiro ano de crise da dívida.
O acordo entre o governo e os bancos, que estão ainda parcialmente controlados pelo Estado, ajudou os proprietários de imóveis da ilha, já que é perdoada a dívida que exceder 110% do valor da habitação. Além disso, em decorrência de uma decisão da Suprema Corte em Junho de 2010, os empréstimos que se encontram indexados em moedas estrangeiras são considerados ilegais, isto é, as famílias já não têm que cobrir as perdas cambiais.

As lições da crise
"A lição que devemos aprender com a crise na Islândia é que, se outros países consideram necessário realizar um desconto, deveriam olhar para o êxito que o acordo dos 110% obteve aqui", diz Thorolfur Matthiasson, professor de economia na Universidade da Islândia, em Reykjavik. "É o acordo mais amplo já levado a cabo", diz ele. Sem o plano de emergência, os proprietários de residências teriam ficado afogados sob o peso de seus empréstimos, depois de a relação entre a dívida e o rendimento ter disparado para 240% em 2008, acredita Matthiasson.
A economia de 13 mil milhões de dólares da Islândia contraiu em 6,7% em 2009, cresceu 2,9% no ano passado e expandir-se-á 2,4% este ano e no próximo, segundo estimativas da OCDE. Em contrapartida, a economia na zona do euro irá crescer apenas 0,2% este ano e na área da OCDE irá crescer 1,6%, segundo estimativas de Novembro.
O sector imobiliário, medido como um sub-componente do índice de preços ao consumidor está agora apenas 3% abaixo dos valores de Setembro de 2008, pouco antes do colapso. Na semana passada a classificadora Fitch elevou a Islândia ao grau de investimento com perspectiva estável. E concluiu que "a pouco ortodoxa política de resposta para a crise da ilha tem tido êxito".
A abordagem da Islândia para combater a crise baseou-se em dar prioridade às necessidades de sua população frente às do mercado. Quando em Outubro de 2008 se tornou publico que os bancos da ilha estavam à beira da bancarrota, o governo interveio isolando do problema as contas nacionais e deixando os credores internacionais em apuros. O Banco Central impôs controles de capital para garantir a coroa e os novos bancos controlados pelo Estado foram criados a partir dos restos dos prestamistas que fracassaram.
"Ainda há um grande número de pessoas que enfrentam dificuldades, ao mesmo tempo em que há muitos a melhorar", defende o porta-voz do Landsbankinn hf, Kristjánsson. "É quase impossível dizer quando parar por ser suficiente. A cada nova medida que se toma, surgem novas exigências para o futuro", acrescenta. Como precursor do movimento global que tem ocupado as praças do mundo – como o 15-M na Espanha ou as actuais mobilizações na Wall Street, Nova York – os islandeses saíram às ruas após o colapso económico de 2008. Os protestos intensificaram-se no início de 2009, obrigando a polícia a usar gás lacrimogéneo para dispersar a multidão que atirava pedras ao Parlamento e ao gabinete do então primeiro-ministro Geir Haarde. O Parlamento ainda está a decidir se avança com a acusação apresentada contra ele em Setembro de 2009, pelo seu papel na crise.
Uma nova coligação política, liderada pela primeira-ministra social-democrata Johanna Sigurdardottir, assumiu o poder no início de 2009. As autoridades ainda investigam a maioria dos protagonistas da crise bancária na Islândia.

As consequências legais
O promotor especial para a Islândia indicou que poderia indiciar um máximo de 90 pessoas, enquanto mais de 200 – incluindo os ex-executivos dos três maiores bancos – enfrentam acusações criminais. Larus Welding, ex-director executivo do Glitnir Bank, que já foi o segundo maior banco da Islândia, foi acusado em Dezembro de conceder empréstimos ilegais e agora aguarda julgamento. O ex-director geral do Landsbanki Islands HF, Sigurjon Arnason, tem sofrido períodos de detenção, enquanto prossegue sua investigação criminal.
O processo tem paralelo nos EUA, onde altos executivos bancários têm enfrentado processos criminais pelo seu papel no colapso das hipotecas de alto risco, conhecidas como subprime. A Comissão da Bolsa de Valores disse no ano passado que havia sancionado 39 responsáveis superiores por condutas relacionadas com a crise do mercado imobiliário.

O original encontra-se em Bloomberg e a versão em castelhano em
http://economia.elpais.com/economia/2012/02/20/actualidad/1329774605_883699.html
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

GRÉCIA, A RECEITA INFALÍVEL PARA DESTRUIR UM PAÍS


O FMI e as autoridades financeiras da União Europeia aumentam a pressão sobre a Grécia e dizem que país "ainda não reúne todas as condições" para receber ajuda. Querem mais cortes de gastos públicos. Enquanto isso, na Grécia, crescem os casos de abandono de crianças e de desnutrição infantil, o desemprego bate na casa dos 20%, as camas dos hospitais foram reduzidas em 40%, alunos não receberam livros escolares e cidadãos deficientes, inválidos ou portadores de doenças raras tiveram subsídios e medicamentos cortados. Saiba como destruir um país e seu povo em nome da austeridade. (Marco Aurélio Weissheimer). Pode ler o texto na íntegra aqui

OUTRA POLITICA É POSSÍVEL


De programa em programa, de austeridade em austeridade, os sacrifícios sucedem-se sem fim à vista, o país definha economicamente e a pobreza alastra. Os representantes da ingerência externa vêm a Portugal fazer avaliações da implementação do memorando de entendimento e do impacto que está a ter para o seu negócio especulativo.
Por isso, dizemos que este memorando é bom:
  • É bom para os credores, que num empréstimo de 78 mil milhões de euros, cobram 35 mil milhões de euros de juros;
  • É bom para a troika, que só em comissões por estas avaliações cobra 655M€;
  • É bom para os bancos, que têm à sua disposição 12 mil milhões de euros para o que der e vier e transferiram para o Estado os fundos de pensões, em condições que se podem tornar numa bomba relógio em termos de sustentabilidade financeira da Segurança Social;
  • É bom para os grandes accionistas da EDP, PT e GALP, a quem foi oferecido a participação especial que o Estado detinha nestas empresas (Golden Share);
  • É bom para o Grande Patronato, a quem querem oferecer despedimentos mais fáceis e baratos, a desregulação dos horários de trabalho e a redução dos salários dos trabalhadores;
  • É bom para os detentores das grandes cadeias de distribuição que continuam a asfixiar os preços na produção e a colocar as suas sedes fiscais em paraísos fiscais para não pagar impostos;
  • é bom para os 10% mais ricos, que têm um rendimento 10,3 vezes superior aos 10% mais pobres e cuja diferença está a aumentar, como conclui um estudo recente da própria Comissão Europeia.
Mas, se as medidas do memorando são boas para o capital, são más para os trabalhadores, os jovens, os desempregados e os reformados e pensionistas:
  • Que continuam a ser confrontados com a redução brutal do poder de compra;
  • São más para os 2,7 milhões de portugueses que estão em risco de pobreza ou de exclusão social e, apesar disso, o Governo teima em reduzir ainda mais os apoios sociais;
  • São más para meio milhão de trabalhadores com emprego que vivem abaixo do limiar da pobreza, o que mostra bem a dimensão dos salários de miséria que se praticam em Portugal;
  • São más para os mais de 41% dos desempregados que vivem abaixo do limiar da pobreza;
Mas são más, também, para o país:
  • Porque promovem a recessão económica, deixando o país numa situação cada vez mais debilitada;
  • Porque a criação de riqueza caiu para níveis inferiores a 2001;
  • Porque é responsável pelo encerramento de inúmeras empresas e a destruição massiva de postos de trabalho;
  • Porque a dívida pública, só no último ano, aumentou 19 pontos percentuais, atingindo os 110% do PIB e não pára de crescer. Este é o maior aumento dos países da U.E., logo atrás da Grécia.

Os pacotes sucessivos de austeridade e sacrifícios não criam riqueza.

O país precisa que lhe tirem a corda da garganta para poder respirar, viver, trabalhar, criar riqueza, melhorar as condições de vida dos trabalhadores e das famílias, desenvolver o país e cumprir com os seus compromissos.

Mas tem de o fazer enquanto é tempo e sem subserviências.

Por isso que exigimos a renegociação da dívida, em prazos, montantes e juros, mas também a alteração de políticas tendo como prioridade o crescimento económico, o emprego e a salvaguarda do interesse nacional!
A falácia desta tese – de que direitos sociais são inimigos do desenvolvimento económico - esconde a sua verdadeira motivação, a de que direitos sociais são inimigos dos privilégios do grande capital, que vê precisamente nas áreas da saúde, educação e segurança social importantes fontes de rendimento e chorudos negócios.
Sabemos que cada direito inscrito na nossa Constituição foi produto da luta, da mobilização, da reivindicação e da unidade na acção em cada local trabalho e em cada bairro.

Sabemos que nenhum direito nos foi outorgado pela boa vontade do Grande Patronato, ou dos Governos da política de direita.
E neste tempo, que até a mais valiosa conquista de Abril, a democracia, todos os dias é amputada, com ingerências e condicionamentos externos que impõem políticas anti-sociais e anti-económicas, neste tempo em que as contradições do capitalismo se agudizam em que os detentores do poder não hesitam em radicalizar políticas, impor a violência da pobreza e dos salários de miséria, do desemprego e desprotecção salarial, da negação do direito à saúde e ao ensino, neste tempo, mais do que nunca, os sindicatos têm de ser firmes para defender os direitos dos trabalhadores, os direitos dos jovens, o futuro do país.
É por isso que vamos lutar pelo trabalho com direitos. Não é com precariedade que o país se vai desenvolver.
Vamos lutar contra a tentativa de desregulação do trabalho e de aumentar ainda mais o horário de trabalho, para nos por a trabalhar mais e pagar ainda menos. Em Portugal trabalha-se mais que na média da U.E., trabalhamos mais 30 horas por mês que na Holanda e mais 14 que na Alemanha. Não é a trabalhar mais que se produz mais ou se dinamiza o mercado de trabalho. Vamos lutar contra a facilitação dos despedimentos. Não é com a promoção e aliciamento do despedimento que se combate o desemprego!
Vamos lutar por uma política que aposte no sector produtivo, alicerçado no valor acrescentado, numa dinâmica articulada com o aumento do poder de compra dos salários e das pensões, que permita o escoamento da produção para, com mais produção, criamos mais emprego e assim potenciamos o crescimento económico!
Vamos lutar pelos serviços públicos, universais e gratuitos.

A educação e a qualificação da força de trabalho é um elemento fundamental ao desenvolvimento do país. O Governo faz passar a ideia que há qualificados a mais, quando o que existe é emprego a menos.

A saúde é um direito, não é um negócio. A política do Governo neste sector representa um enorme retrocesso e uma machadada na Constituição!
 Vamos lutar no presente pelo futuro de Portugal, pelo crescimento económico, pela reindustrialização do país, pela independência alimentar, pelo trabalho com direitos e pela soberania e o progresso económico e social(síntese da intervenção do secretário geral da CGTP)
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sábado, 11 de fevereiro de 2012

TERRORISMO ECONÓMICO


Estamos perante uma política de terrorismo económico e social que exige uma resposta de grande dimensão a nível nacional.
O Governo do PSD-CDS e o grande patronato pretendem:

  • colocar o Estado ao serviço das empresas;
  • pôr a segurança social a financiar os patrões para pagar menos e precariezar as relações de trabalho;
  • facilitar os despedimentos e diminuir as indemnizações e o valor do subsídio de desemprego;
  • flexibilizar os horários de trabalho e reduzir a retribuição;
  • atacar a contratação colectiva e promover o trabalho gratuito com a redução de feriados e dias de férias.
Ver site da CGTP

A CRISE DA DÍVIDA NA UNIÃO EUROPEIA (6/7)

 
Entre Julho e Setembro de 2011 as bolsas foram abaladas mais uma vez a nível internacional.   A crise aprofundou-se na União Europeia, sobretudo quanto a dívidas.   O CADTM entrevistou Eric Toussaint a fim de descodificar diferentes aspectos desta nova fase da crise. [1]
CADTM: A crise atingiu o seu apogeu?

Eric Toussaint : Estamos longe do fim da crise. Se nos limitarmos a tomar em conta os aspectos financeiros, há que tomar consciência de que os bancos privados têm continuado a efectuar, desde 2007, um jogo extremamente perigoso que lhes é lucrativo enquanto não houver acidentes e que é prejudicial para a maioria da população. A quantidade de activos duvidosos nos seus balanços é enorme. Ora, se se considerar apenas os 90 principais bancos europeus, é preciso saber que nos próximos dois anos eles deverão refinanciar dívidas no montante astronómico de 5400 mil milhões de euros. Isto representa 45% da riqueza produzida anualmente na União Europeia [2] . Os riscos são colossais e a política conduzida pelo BCE, pela Comissão Europeia e pelos governos dos países membros da UE não resolve nada, ao contrário.

Também é preciso insistir num aspecto central dos riscos assumidos pelos bancos europeus. Eles financiam uma parte importante das suas operações tomando emprestado a curto prazo dólares junto a prestamistas norte-americanos, os US money market funds
[3] , a uma taxa inferior àquela do BCE. Seja como for, para retomar os exemplos dados mais acima a propósito da Grécia, como se pode imaginar que os bancos europeus se tenham contentado com 0,35% a 3 meses quando tiveram de tomar emprestado a 1% junto ao BCE. Eles financiaram e ainda financiam seus empréstimos aos Estados e às empresas na Europa através de tomadas de empréstimos junto aos money market funds dos Estados Unidos. Ora, estes ficaram com medo do que se passava na Europa e têm estado igualmente inquietos com a disputa entre republicanos e democratas sobre a dívida pública dos EUA [4] . A partir de Junho de 2011, esta fonte de financiamento com baixa taxa de juro quase secou, em particular a expensas dos grandes bancos franceses, o que precipitou sua derrocada na bolsa e aumentou a pressão que exerciam sobre o BCE para que este recompre títulos e portanto lhes forneça dinheiro fresco. Em resumo, também aqui temos a demonstração da amplidão dos vasos comunicantes entre a economia dos Estados Unidos e a dos países da UE. Daí os contactos incessantes entre Barack Obama, Angela Merkel, Nicolas Sarkozy, o BCE, o FMI... e os grandes banqueiros do Goldman Sachs ao BNP Paribas passando pelo Deutsche Bank... Uma ruptura dos créditos em dólares de que beneficiam os bancos europeus pode provocar uma crise muito grave no velho continente, assim como uma dificuldade dos bancos europeus para reembolsar seus prestamistas.
estado-unidenses pode precipitar uma nova crise da Wall Street.

Desde 2007-2008, os bancos e os outros investidores institucionais (
zinzins ) deslocaram suas actividades especulativas do mercado imobiliário (onde provocaram uma bolha que explodiu numa dezena de países, a começar pelos Estados Unidos) para o mercado das dívidas públicas, o das divisas (onde se intercambia a cada dia o equivalente a 4 milhões de milhões de dólares dos quais 99% correspondem à especulação) e o dos bens primários (petróleo, gás, minerais, produtos agrícolas). Estas novas bolhas podem explodir de um momento para o outro. Um dos disparadores poderia ser uma reascensão das taxas de juro que a Reserva Federal dos EUA decidisse (seguida a seguir pelo BCE, o Banco da Inglaterra, ...). Pelo seu lado, o Fed anunciou em Agosto de 2011 a intenção de manter sua taxa de juro directora próxima de zero até 2013. Mas outros acontecimentos podem constituir o detonador de uma nova crise bancária ou de um crash bolsista. Os acontecimentos de Julho-Agosto de 2011 mostram-nos que é tempo de reunir energias para por as instituições financeiras privadas em condições de não continuar a prejudicar.

A amplitude da crise também é determinada pelo volume da dívida pública dos Estados e seu modo de financiamento na Europa. Os banqueiros europeus detêm mais de 80% da dívida total dos países de um conjunto de países europeus em dificuldade como a Grécia, Irlanda, Portugal, países do Leste europeu, Espanha e Itália. Em volume, os títulos da dívida pública italiana representam 1500 mil milhões de euros, o que é mais do dobre da dívida pública da Grécia, da Irlanda e de Portugal tomada em conjunto. A dívida pública da Espanha atinge 700 mil milhões de euros (a metade da da Itália). A conta é fácil de fazer: as dívidas públicas da Itália e da Espanha representam o triplo das dívidas públicas grega, irlandesa e portuguesa. Como se viu em Julho-Agosto de 2011, apesar de cada país continuar a reembolsar suas dívidas, vários bancos quase entraram em colapso. Foi a intervenção do BCE que os salvou. A armação financeira dos bancos europeus é de tal modo frágil que um ataque em bolsa pode colocá-los na lona. Sem falar, naturalmente, de um crash bancário que também é perfeitamente possível.

Até aqui, à parte o trio Grécia – Irlanda – Portugal, os Estados haviam conseguido refinanciar sem grande dificuldade as suas dívidas recorrendo a novas tomadas de empréstimo quando o capital emprestado chegava ao fim do prazo. A situação degradou-se fortemente nestes últimos meses. Já em Julho e princípio de Agosto de 2011, as taxas exigidas pelos investidores institucionais para permitir à Itália e à Espanha refinanciarem as suas dívidas públicas chegava ao fim do prazo por empréstimo a 10 anos haviam literalmente explodido e atingiam os 6%. Mais uma vez, foi a intervenção do BCE que recomprou maciçamente títulos espanhóis e italianos que permitiu satisfazer os banqueiros e outros investidores institucionais e fez baixar as taxas. Por quanto tempo? Com efeito, a Itália deve tomar emprestado cerca de 300 mil milhões de euros em Agosto de 2011 e Julho de 2012 pois é este o montante das obrigações que chegam ao seu termo durante este curto lapso de tempo. As necessidades da Espanha são claramente inferiores
cerca de 80 mil milhões de euros, mas ainda assim é uma soma considerável. Como se comportarão os investidores institucionais no curso dos doze meses que vêm e o que se passará se as condições em que tomam empréstimos no mercado norte-americano endurecerem? Há muitos outros acontecimentos que podem agravar a crise internacional. Uma coisa é certa: a política actual da Comissão Europeia, do BCE e do FMI não conduzirá a uma solução favorável.

CADTM: Por diversas vezes tens escrito que a dívida privada era muito mais volumosa que a dívida pública. Ora, aqui estás concentrado na dívida pública...

Eric Toussaint: Não há nenhuma dúvida quanto a isso, as dívidas privadas são muito mais importantes do que as dívida públicas. Segundo o último relatório do McKinsey Global Institute, a soma das dívidas privadas à escala mundial eleva-se a US$117 milhões de milhões, ou seja, cerca do triplo do conjunto das dívidas públicas cujo volume atinge US$41 milhões de milhões. É grande o risco de que empresas privadas, dentre as quais os bancos certamente fazem parte juntamente com os outros investidores institucionais, não consigam enfrentar o reembolso das suas dívidas. A General Motors e o Lehman Brothers caíram em falência em 2008 assim como numerosas empresas pois eram incapazes de reembolsar as suas dívidas.

Os banqueiros, os outros chefes de empresas, os media tradicionais e os governos não querem falar senão das dívidas públicas e tomam como pretexto o seu aumento a fim de justificar novos ataques contra os direitos económicos e sociais da maioria da população. A austeridade e a redução dos défices públicos com cortes claros nos orçamentos sociais e no emprego da função pública tornaram-se as receitas únicas, às quais se acrescentam privatizações e novos impostos sobre o consumo. Para não ficar atrás, na Europa, certos governos acrescentam uma minúscula taxa a cargo dos ricos e falam em tributar as transacções financeiras.

É evidente que o aumento das dívidas públicas é o resultado de 30 anos de políticas neoliberais: financiamento pelo recurso a reformas fiscais que favorecem as grandes fortunas e as grandes empresas privadas, salvamento dos bancos e de outras empresas ponto uma parte das suas dívidas ou das suas perdas a cargo do orçamento do Estado, nova baixa das receitas fiscais devida aos efeitos da recessão e aumento de certas despesas públicas para ajudar vítimas da crise. O efeito combinado destes diferentes factores fez aumentar a dívida pública. Tudo se reduz a uma política deliberadamente injusta do ponto de vista social, visando favorecer sistematicamente uma classe da sociedade, a classe capitalista, sendo distribuídas algumas migalhas às camadas médias a fim de controlá-las. Em contrapartida, a grande maioria da população aguentou os custos destas políticas e viu seus direitos serem fortemente desfalcados, ou mesmo claramente espezinhados. É por isso que é preciso considerar que a dívida pública é globalmente ilegítima. Foi por isso que concentrei minhas respostas sobre a dívida pública pois é preciso absolutamente obter uma solução positiva quanto a esta questão. (por Eric Toussaint [*] )
Notas
|1| Republicação de entrevista, aparecida em 26/Agosto/2011 , em sete partes:
primeira parte:
"La Grèce au cœur des tourmentes";
segunda parte:
"La grande braderie des titres grecs" ;
terceira parte:
"La BCE, fidèle serviteur des intérêts privés";
quarta parte:
"Le 'Plan Brady' européen: austérité permanente";
quinta parte:
"CDS et agences de notation: fauteurs de risques et de déstabilisation"

|2| Ver Gillian Tett no Financial Times de 5/Agosto/2011, p. 22, assim como Peterson Institute for International Economics, Europe on the Brink, July 2011.

|3| Ver Daniel Munevar,
"El pequeño y oscuro secreto de los bancos europeos" .

|4| Ver "US funds cut eurozone exposure" no Financial Times, 25/Julho/2011, p. 15.
[*] Doutorado em ciências políticas pelas universidades de Liège e de Paris VIII, presidente do CADTM Bélgica, membro da Comissão presidencial de auditoria integral da dívida (CAIC) do Equador e do Conselho científico do ATTAC França. Dirigiu com Damien Millet o livro colectivo "La Dette ou la Vie" , Aden-CADTM, 2011. Participou no livro da ATTAC: "Le piège de la dette publique. Comment s'en sortir", edição Les liens qui libèrent, Paris, 2011.

O original encontra-se em
http://www.cadtm.org/La-crise-a-t-elle-atteint-son